O projeto

O Projeto Vidas Paralelas (PVP) é resultado imediato da Rede Escola Continental de Saúde do Trabalhador (REC-ST), criada em 2005 como uma necessidade estabelecida pela III Conferência Nacional de Saúde do Trabalhador em sua resolução 300.
A REC-ST foi pensada para procurar a valorização da cultura, das experiências e dos saberes construídos dos trabalhadores, sendo o PVP o seu mecanismo de visibilidade. Criado em 2007, o projeto conta atualmente com a participação de 760 trabalhadores cadastrados e treinados para usarem o site http://www.cultura.gov.br/vidasparalelas/ como veículo de publicação, um meio para que o trabalhador documente sua própria história.
Segundo Graça Hoefel, coordenadora do projeto, “é interessante observar a documentação do próprio trabalhador. Historicamente, quem sempre fez essa documentação foram os fotógrafos, os jornalistas, a universidade, nunca o próprio trabalhador. Esse fato dele poder documentar nos acrescenta uma visibilidade muito importante.”
A equipe coordenada por Graça procura alcançar três objetivos:
- Conhecer o mundo do trabalho a partir do ponto de vista do trabalhador;
- Incitar à visão crítica e à criatividade por meio da produção de fotografias, textos e vídeos, como forma de auto-representação;
- Construir um processo de reflexão e diálogo entre os trabalhadores, possibilitando a difusão do cotidiano laboral e cultural dos mesmos.
Para Marcio Blanco, um dos membros da equipe, os objetivos tem sido alcançados. Ele observa que alguns dos posts publicados pelos produtores já surtiram efeito no que se refera às políticas públicas. Houve uma denúncia que obrigou um supermercado a fazer mudanças na maneira de estocar seus alimentos.
Os trabalhadores que se tornam produtores de conteúdo do site são indicados por sindicatos, centrais sindicais e associações. Graça explica que “a escolha é feita no próprio estado. Nós temos uma rede, que é a rede de apoio do projeto que busca os trabalhadores e, a partir de uma assembléia, faz essa escolha. Na verdade, existem diversos caminhos, às vezes, é um dirigente sindical que indica ou uma associação, dentro de sua própria rede, mas o projeto prevê que haja um contato com o sindicato e esse sindicato, em assembléia, indica um trabalhador que assume a responsabilidade de ser multiplicador no seu sindicato”.
Ainda segundo ela, os resultados do projeto podem ser avaliados através das denúncias:”O site está se transformando em uma referência, até para o Ministério da Saúde, de denúncias sobre a saúde do trabalhador”. Essa tendência de se tornar uma referência é confirmada por João Lucas, do Sindicato dos Empregados em Supermercados do Rio Grande do Norte. “O Ministério Público no RN tem feito do PVP instrumento de pesquisa, diariamente eles acompanham as postagens no site do PVP. Muitas vezes quando faço uma postagem eles ligam dizendo se queremos fazer uma denúncia. Tem resolvido muitas situações”.
Pelo aspecto da cultura, Kátia Santorum, professora da Universidade Federal da Bahia, comenta um outro resultado do PVP, este na transmissão de saberes. “O PVP proporciona o encontro de diferentes saberes que vem de diferentes lugares e experiências os quais tem grande potência para a transformação da vida e do mundo, principalmente com a produção de imagens e promoção da saúde.”
O PVP tem atualmente produtores de conteúdo espalhados por 21 estados brasileiros e pretende ampliar em breve seu alcance entre os trabalhadores da América Latina.
Parceria entre instituições
O Projeto Vidas Paralelas (PVP) é coordenado por um esforço conjunto da Secretaria de Identidade e Diversidade Cultural do Ministério da Cultura (SID/MinC), do Departamento de Vigilância Ambiental e Saúde do Trabalhador do Ministério da Saúde, do Departamento de Saúde Coletiva da Universidade de Brasília (UnB) e da REC-ST.
Leonardo Fontes (SID/MinC)
Entrevista com Márcio Blanco, um dos coordenadores do Vidas Paralelas
Márcio Blanco é um dos coordenadores do Projeto Vidas Paralelas desde 2008. Sua experiência com jornalismo cidadão em uma cobertura dos jogos Pan-Americanos no Rio feita por jovens da favela da Maré o credenciou para o PVP. A seguir, Blanco oferece um panorama completo do projeto, que acredita estar cumprindo com os objetivos.
Me conta um pouco o teu papel no PVP, o que você faz no Projeto Vidas Paralelas?
Eu entrei em 2008, foi em uma etapa que a coordenação estava pesquisando ações na área de comunicação. Eu participei de um encontro e apresentei um trabalho que fazia com jovens da favela da Maré, aqui no Rio, que utilizava blog e celulares para esses jovens se expressarem. Era um trabalho com um caráter jornalístico, uma cobertura dos jogos Pan-Americanos no Rio. A coordenação gostou e eu também me interessei pelo PVP. Daí comecei a participar de reuniões de construção do PVP e não parei mais. Em 2008, participei de várias reuniões nacionais e contribuí junto com outras pessoas no desenho que o projeto tem hoje. Hoje faço parte da coordenação do projeto no que diz respeito às oficinas de formação e construção do site.
Sua área é o jornalismo ou é mais técnica?
Sou de cinema, mas trabalho com educação, periferia e comunicação há 10 anos. Hoje eu dirijo um festival chamado Visões Periféricas. Um vídeo de um dos trabalhadores do PVP ganhou neste ano, na mostra “tudojuntoemisturado”, chama-se “Observador do Mundo”, do Mestre Lua. E tem outro da Maria Da Paz que também competiu, “Viver e não ter vergonha de ser feliz”. É o meu preferido.
Você entrou no projeto, está nele já tem aí uns dois anos, você acha que ele se desenrolou como previsto? Como você acha que o projeto tem influenciado na vida dos trabalhadores/produtores?
Sim. Hoje existe uma rede de trabalhadores que posta no site e dá visibilidade a seu universo de trabalho. Atualmente são 800 pessoas registradas e alguns desses post já surtiram efeito em termos de políticas públicas. Houve uma denúncia a um supermercado que obrigou o supermercado a fazer mudanças na estocagem de alimentos.
Algumas dessas notícias chegou a gerar pauta na mídia mais tradicional? Vi algumas notícias bem interessantes por lá, uma das últimas a cobertura de uma rebelião.
Sim, soube de algo no Globo. Tem um outro efeito na vida do trabalhador que diz respeito ao lado pessoal, ter visibilidade como sujeito. Olha o caso do Nico, alguém que tem uma trajetória pessoal não é apenas uma estatística, essa é a vantagem de se trabalhar em rede, ganha visibilidade através do seu próprio discurso, constrói a narrativa sobre a sua vida, isso gera um ganho na estima desse trabalhador enorme, pois ele passa a se sentir parte de um mundo que é cada vez mais mediado pela comunicação.
Você tem planos para uma evolução do projeto?
Agora temos que trabalhar demandas mais locais, saber o que cada estado está trabalhando, suas demandas, evolução da participação dos trabalhadores e fortalecer esse vínculo do trabalhador e as instituições para que o site do Vidas tenha cada vez mais reflexo na construção de políticas e ações de defesa do trabalho.
Você tem ideia de quantos desses trabalhadores, você falou em 800 cadastrados, realmente pegam o gosto pela coisa?
Olha, estamos em fase de fazer esse levantamento pois os estados estão concluindo seus relatórios, mas a priori aqueles que já tinham algum hábito de usar a internet acabam postando mais e aqueles que tem dificuldades procuram outros projetos de inclusão digital para seguir se aperfeiçoando.
Quais são as maiores dificuldades deles?
Tem muitos trabalhadores no PVP que são de uma geração que não se educou com a internet, acho que a maior dificuldade é entender e se inserir dentro dessa nova cultura digital, pois a internet não não é só um novo instrumento para antigas práticas, ela demanda novas formas de pensar e agir, o que é uma mudança muito radical para alguns… que é mais fácil de inserção para os mais jovens, mas sempre procuramos frisar que o conceito de rede que a internet traz não é novidade, a rede sempre esteve presente na vida de todos, família, amigos, vizinhos, colegas de trabalho. É uma mudança radical por causa da barreira da tecnologia mas o pensamento colaborativo é algo muito forte dentro das camadas populares.
Ou seja, é na verdade não um processo de aprendizado de uma estrutura nova, mas apenas de adaptação a um novo meio.
Sim, em um certo nível é fácil que eles façam esses paralelos, pois como eu disse a rede não é algo novo, mas o lance é que a internet traz questões mais difíceis de apreender. Como, por exemplo, o fato da utilização de dados na internet, discussões sobre autoria, coisas que estão muito em discussão mas que não chegamos a tocar, pois não temos tempo para isso.
Leonardo Fontes (SID/MinC)
Postado por: Eduardo Alves
Categoria: Ações, Cultura do Trabalhador, Economia Criativa, Notícias, Notícias da SID
Tags: SID 7 anos, SID/MinC, Vidas Paralelas
SID 7 Anos
Entrevista com Rose Costa, uma das produtoras do Vidas Paralelas
Rose Costa é professora em São Luís, no Maranhão, e está no Projeto Vidas Paralelas desde maio de 2010. É uma das produtoras mais ativas do projeto e acredita que o PVP mudou sua vida. Ela concedeu a entrevista em um domingo, por Skype, onde nos falou sobre sua experiência.
Qual sua profissão, como começou a fazer parte do projeto vidas paralelas?
Professora de ensino fundamental e médio da rede municipal e estadual em São Luís do Maranhão.
Eu fui convidada pelo companheiro Joel do Sindimetal, pediu para que alguém do sindicato dos professores indicasse um professor ou professora para participar do Projeto Vidas Paralelas, daí eu fui a professora convidada.
Daí lá você passou por um processo de treinamento com os oficineiros do PVP…
Isso, nós tivemos uma oficina de três dias em São Luís com o Márcio e o Ricardo, daí eu comecei a fazer as postagens, a princípio a gente fica com um certo receio se está fazendo a coisa certa ou errada, mas depois a gente vai ficando bem mais ambientado e entendendo o que é realmente o objetivo do projeto.
Qual foi a postagem que você mais gostou de fazer?
Foi a do vídeo sobre a aula do professor Fabio, onde ele está ministrando uma aula e eu faço o vídeo… ele faz o relato sobre o que ele vê, o que ele percebe no ambiente lá, na sala de aula, que prejudica nossa saúde. E outros que fiz sobre cultura mostrando a questão cultural do Maranhão.
Quantas pessoas participam do PVP com você?
Aqui em São Luís tem de 11 a 12 e são bons, aí tem o pessoal de Caxias, tem o pessoal de Imperatriz.
Você está desde quando no projeto?
Eu comecei ano passado na oficina de maio, mas o projeto é mais antigo aqui no Maranhão.
O projeto é uma parceria entre Ministério da Cultura e Ministério da Saúde, voltado para a saúde e cultura do trabalhador, como você vê a importância do projeto para sua vida?
Eu penso assim, que ele pode ter um efeito muito positivo, mas ainda não surtiu, porque não basta só eu postar, eu acho que tem que ter um conhecimento de todos os trabalhadores em participar, em fazer comentários, enriquecer mais a postagem de uma denúncia ou de qualquer coisa que eu postar e o próprio sindicato participar mais, o sindicato ainda está muito alheio a esta questão de estar em parceria com o trabalhador neste trabalho.
Você acha que o sindicato e os próprios trabalhadores tem pouco engajamento?
É, eu acho que falta engajamento, e eles tem até medo mesmo, eu fico divulgando nas escolas onde eu vou, eu deixo o endereço e peço para eles acessarem e deixarem seu comentário, mas eles tem um certo receio, como se eles fossem se prejudicar, de perder o emprego, e pelo contrário, eu acho que o nosso papel enquanto cidadão é exercer nossa cidadania participativa independente de perder o emprego ou não, eu acho que a gente tem que estar mobilizado, e hoje, com a tecnologia, as ideias tem que estar circulando constantemente, não se pode ficar preso nos problemas, se somos parte do problema somos parte da solução.
Você tem mais alguma coisa a acrescentar?
Eu gosto muito do PVP, eu mudei muito minha atitude enquanto trabalhadora depois que passei a participar do PVP, porque é uma maneira pela qual eu posso buscar a valorização do profissional da educação.



0 comentários:


Postar um comentário